Moro apresenta mensagens de tentativa de interferência política de Bolsonaro na PF
O ex-ministro da Justiça Sergio Moro apresentou troca de mensagens que mostram interferência política de Bolsonaro na Polícia Federal (PF). As mensagens foram exibidas no Jornal Nacional desta sexta-feira (24).
Nas mensagens exibidas Bolsonaro compartilha link de uma matéria do site O Antagonista com o título “PF na cola de 10 a 12 deputados bolsonaristas”, seguida da mensagem: “mais um motivo para a troca”, em referência à troca do comando da Polícia Federal que motivou a demissão de Moro do cargo de ministro da Justiça e Segurança Pública.
“Esse inquerito é conduzido pelo Ministro Alexandre no STF, diligências por ele determinada, quebras por ele determinadas, buscas por ele determinadas.Conversamos em seguida às 9h00”, respondeu Moro.
A matéria postada por Bolsonaro foi publicada na última quarta-feira e fala sobre a investigação aberta pelo ministro do STF, Alexandre de Moraes, sobre atos em favor do AI-5 e do fechamento de instituições republicanas que tiveram a participação do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) no domingo (19).
Na última terça-feira (21), Moraes autorizou a abertura de um inquérito para investigar possível violação da Lei de Segurança Nacional, atendendo a pedido do procurador-geral da República, Augusto Aras.
No pronunciamento em que confirmou sua saída, Moro afirmou Moro disse que o presidente o informou ter preocupação com investigações conduzidas pelo Supremo Tribunal Federal (STF). “O presidente me informou que tinha preocupação com inquéritos em curso no Supremo Tribunal Federal e que a troca seria oportuna, da Polícia Federal, por esse motivo. Não é uma razão e é algo que gera muita preocupação”.
Moro afirmou também que Bolsonaro insistiu, por diversas vezes, em nomear um comandante para a PF que fosse de confiança dele, para que ele pudesse ter acesso a inquéritos sigilosos.
“Ele [Bolsonaro] me disse que queria ter uma pessoa do contato pessoal dele, que ele pudesse colher informações, que ele pudesse colher relatórios de inteligência. Realmente, não é o papel da Polícia Federal prestar esse tipo de informação. As investigações têm que ser preservadas”, declarou o, agora, ex-ministro.
Vaga no STF
Moro também apresentou troca de mensagens em que a deputada federal Carla Zambelli (PSL-SP) recomenda a ele aceitar a nomeação de Alexandre Ramagem para a PF de forma a garantir uma vaga para ele no STF.
“Aceite o Ramage e vá sem setembro para o STF eu prometo ajudar, a fazer o JB prometer. Me comprometo a fazer Bolsonaro aceitar a ideia”, escreveu Zambelli. Moro negou o pedido “prezada, não estrou à venda”. O ex-juiz foi padrinho de casamento da deputada.
Alexandre Ramagem, diretor-geral da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) é o nome que o presidente Jair Bolsonaro tentava emplacar na PF, mas Moro não aceitou. Ramagem foi o chefe da equipe de segurança do presidente na campanha de 2018.
Pronunciamento
Em discurso confuso após as acusações do ex-ministro Sergio Moro sobre interferir na Polícia Federal (PF), no fim da tarde desta sexta-feira (24), Bolsoanro afirmou que o ex-ministro barganhou uma indicação ao Supremo Tribunal Federal (STF) ao negociar quem comandaria a corporação policial.
“Já que ele falou de algumas particularidades, mais de uma vez o senhor Sergio Moro disse: você pode trocar o Valeixo, sim, mas depois de novembro, depois que me indicar ao STF. Desculpa, mas não é por aí”, afirmou o presidente em cadeia nacional de televisão.
Logo após o discurso presidencial, o juiz Sérgio Moro, que pediu demissão do cargo nesta sexta (24), negou que tenha utilizado a nomeação ao STF como moeda de troca.
“A permanência do Diretor Geral da PF, Maurício Valeixo, nunca foi utilizada como moeda de troca para minha nomeação para o STF. Aliás, se fosse esse o meu objetivo, teria concordado ontem com a substituição do Diretor Geral da PF”, postou Moro.
“De fato,o Diretor da PF Maurício Valeixo estava cansado de ser assediado desde agosto do ano passado pelo Presidente para ser substituído.Mas,ontem,não houve qualquer pedido de demissão,nem o decreto de exoneração passou por mim ou me foi informado”, postou em seguida.
Pedido de inquérito no STF
O procurador-geral da República, Augusto Aras, solicitou nesta sexta-feira (24) ao Supremo Tribunal Federal (STF) a abertura de inquérito para apurar se os fatos narrados e as declarações feitas pelo ex-ministro da Justiça e da Segurança Pública, Sergio Moro, configuram crimes de responsabilidade cometidos pelo presidente da República, Jair Bolsonaro (sem partido).
Entre as providências, o procurador-geral solicita ao Supremo que Moro seja chamado a depor em razão da abertura do inquérito.
O pedido, registrado no STF como Inquérito 4.829, aponta a eventual ocorrência, em tese, dos crimes de falsidade ideológica, coação no curso de processo, advocacia administrativa, prevaricação, obstrução de Justiça, corrupção passiva privilegiada, denunciação caluniosa e crime contra a honra.
O presidente reconheceu que cobrou informações da Polícia Federal por meio do então ministro. “Sempre falei para ele: Moro, não tenho informações da Polícia Federal. Tenho que todo dia saber o que aconteceu nas últimas 24 horas para poder bem decidir o futuro dessa nação”.
Despedida
No discurso em que anunciou sua demissão, Moro disse que a vontade expressa de Bolsonaro em querer indicar um nome “político-partidário” para comandar a PF foi “uma sinalização que o presidente me quer fora do cargo”. “Quando se começa a preencher esses cargos técnicos com político-partidários, o resultado não é bom”, sugeriu.
O ex-magistrado admitiu que foi dele a indicação de Valeixo para o cargo de diretor máximo da PF, mas que concordava com uma mudança contanto que o nome do substituto fosse técnico. O presidente, segundo ele, não aceitou.
Moro garantiu no discurso de sua demissão que nunca fez exigências para aceitar ou se manter no cargo, com exceção de um amparo à família dele “caso algo acontecesse”.
“Tem uma única condição que eu coloquei. Não ia revelar, mas agora não faz mais sentido manter em segredo: como eu estava abandonando 22 anos de magistratura, contribui 22 anos para a presidência, pedi apenas, já que nós íamos ser firmes contra a criminalidade, que, se algo me acontecesse, a minha família não ficasse desamparada. Foi a única condição que eu coloquei para assumir essa posição específica [de ministro]”.
O ex-ministro reconheceu que, enquanto esteve à frente da Lava Jato, o governo de Dilma Rousseff (PT) nunca tentou interferir na autonomia das investigações. “Aquele governo [de Dilma] tinha diversos defeitos, mas garantiu a autonomia das investigações, o que foi fundamental”. (Brasil de Fato)