Carta de Van Gogh e Gauguin vendida por mais de 210 mil euros

Publicado em 17.06.2020 às 14:16

Uma carta escrita por Vincent Van Gogh e Paul Gauguin, em 1888, ao também pintor Emile Bernard, foi na terça-feira vendida num leilão, em Paris, por 210.600 euros. A Fundação Vincent Van Gogh, em Amesterdão, comprou a missiva onde os dois artistas do século XIX falavam sobre visitas a bordéis franceses. Na carta de quatro páginas, os pintores falam das suas visitas a bordéis em Arles, em França, e assumem que as suas obras estão a liderar o “grande renascimento da arte”. Considerado um documento “excecional”, revela ainda o desejo de reavivar a arte moderna e de criar uma associação de pintores. 

Temos ido a bordéis e é provável que comecemos a ir trabalhar para lá várias vezes“, pode ler-se na carta dirigida a Emile Bernard. 

Os dois artistas relatam ainda a primeira semana de convivência na Casa Amarela da cidade, um café com quartos para alugar, imortalizado por Van Gogh numa pintura a óleo, e demolido depois de ter ficado parcialmente destruído durante a Segunda Guerra Mundial.
Neste momento, Gauguin está a pintar uma tela do mesmo bar noturno que eu também pintei, mas com figuras vistas nos bordéis. Promete tornar-se uma coisa linda“, escreveu o artista holandês.

O texto foi enviado de Arles, no sul da França, no início do mês de novembro de 1888, menos de dois anos antes de Van Gogh ter morrido, aos 37 anos.  

A leiloeira, Drouot, referiu que “o documento reflete a imensa lucidez destes artistas quanto às mudanças que ocorrem à sua volta. São plenamente conscientes de que a sua arte marca um ponto de inflexão que só será entendido pelas gerações futuras“.

Admito que não entendo por que não faço estudos de figuras, embora teoricamente às vezes seja tão difícil para mim imaginar a pintura do futuro como algo além de uma nova série de grandes retratistas, simples e compreensíveis para todo o mundo – o público em geral “, escreveu também Van Gogh. “De qualquer forma, talvez em breve eu comece a pintar bordéis“. 

O trabalho conjunto destes dois artistas em Arles visava ser o primeiro passo para realizar o sonho de Van Gogh de criar uma espécie de associação de pintores. Segundo Van Gogh, o artista francês era um potencial líder de uma associação desse tipo.

Gauguin interessa-me muito como homem – muito. Durante muito tempo, pareceu-me que, no nosso trabalho imundo como pintores, temos a maior necessidade de pessoas com as mãos e o estômago de um trabalhador. Gostos mais naturais – temperamentos mais amorosos e benevolentes – do que o decadente e exausto parisiense-sobre-a-cidade“.

Gauguin é “uma criatura intocada com os instintos de um animal selvagem“, acrescentou. “Com Gauguin , sangue e sexo têm vantagem sobre a ambição. Mas fico por aqui, tu viste-o por muito mais tempo do que eu, só queria contar-te as primeiras impressões em poucas palavras“.

Paul Gauguin escreve no final da carta para que o amigo de ambos “não dê ouvidos a Vincent”: “Sabes como ele é impressionável”, acrescenta.
O artista francês chegou a Arles, onde Van Gogh vivia em outubro de 1888, e os dois passaram vários meses a pintar. Foi ainda durante essa visita de Gauguin que Van Gogh perdeu a orelha.
Terá sido, aliás, depois de uma discussão entre os dois que Van Gogh terá cortado a orelha. 

A carta, escrita em francês, foi comprada em Paris na terça-feira pela Fundação Vincent Van Gogh e fará parte de uma exposição no Museu Van Gogh a partir de outubro, intitulada “Seu amado Vincent: As Maiores Cartas de Van Gogh”.

RTP, emissora pública de Portugal